Celebra-se
nesta terça-feira, 11 de fevereiro, o primeiro aniversário do anúncio da
renúncia ao ministério petrino de Bento XVI. Um gesto destinado a permanecer no
tempo, que foi tomado com imensa surpresa no mundo inteiro e não somente na
Igreja. De fato, no momento da renúncia, muitos observadores admitiram que não
se estava preparado para uma decisão de tal alcance. Para uma reflexão um ano
após a renúncia do Papa Bento XVI, a Rádio Vaticano ouviu o diretor da Sala de
Imprensa da Santa Sé, Pe. Federico Lombardi.
Pe. Federico Lombardi:- "Há séculos
não se via uma renúncia por parte de um Papa e, portanto, para a grandíssima
maioria das pessoas se tratava de um gesto inusitado e surpreendente. Na
realidade, para quem acompanhava Bento XVI mais de perto, se entendia que havia
uma reflexão sobre esse tema, e já o havia dito explicitamente em sua
conversação com Peter Seewald, algum tempo antes – muito tempo antes. E,
portanto, era um tema sobre o qual ele rezava, refletia e avaliava, fazia um
discernimento espiritual. Foi o que colocou em prática ao nos comunicar e o fez
de modo sintético no dia da sua renúncia, naquelas palavras breves, mas
densíssimas que explicavam de modo absolutamente adequado e claro os critérios
segundo os quais tomara a sua decisão.
O que digo – e o disse já na ocasião – é que
me parecia um grande ato de governo, ou seja, uma decisão tomada livremente que
incide verdadeiramente na situação e na História da Igreja. Nesse sentido, é um
grande ato de governo, feito com uma grande profundidade espiritual, uma grande
preparação do ponto de vista da reflexão e da oração; uma grande coragem
porque, efetivamente, tratando-se de uma decisão inusitada, podia haver
problemas ou dúvidas sobre "o que teria" significado, como reflexos,
como conseqüências para o futuro, como reação por parte do povo de Deus ou do
público. A clareza com a qual Bento XVI se preparou para este gesto e, diria, a
fé com a qual se preparou, deram-lhe a serenidade e a força necessárias para
colocá-lo em prática, caminhando com coragem e serenidade, com uma visão
verdadeiramente de fé e de expectativa do Senhor que acompanha continuamente a
sua Igreja, diante dessa situação nova que ele viveu em primeira pessoa,
durante várias semanas, e que depois a Igreja viveu com a sucessão, a eleição
do novo Papa, como todos sabemos. Eis, portanto, verificou-se plenamente, por
parte do Espírito do Senhor, este sentido de acompanhamento da Igreja em
caminho."
RV: Um ano atrás, muitos se perguntavam
como seria a inédita convivência entre dois Papas. Hoje se vê que tanto temor –
talvez mais da parte de "especialistas" do que do Povo de Deus – era
exagerado...
Pe. Federico Lombardi:- "Sim...
deste ponto de vista, parecia-me absolutamente claro que não havia motivo para
se ter nenhum temor. Por quê? Porque a questão é o fato de o papado ser um
serviço e não um poder. Se os problemas são vividos em chave de poder, então é
claro que duas pessoas podem ter dificuldade a conviver porque pode ser difícil
renunciar a um poder e conviver com o sucessor. Mas se se vive tudo exclusivamente
como serviço, então uma pessoa que cumpriu o seu serviço diante de Deus e em
plena consciência passa o bastão deste serviço a outra pessoa que com atitude
de serviço e de plena liberdade de consciência realiza esta tarefa, então o
problema não existe absolutamente! Há uma solidariedade espiritual profunda
entre os Servidores de Deus que buscam o bem do povo de Deus no serviço do
Senhor."
RV: Bento XVI despediu-se ressaltando
que teria continuado a servir a Igreja mediante a oração: essa foi uma
contribuição realmente extraordinária que deu, e que ainda continua dando, não
é isso mesmo?
Pe. Federico Lombardi:- "Sim...
apresento apenas uma pequeníssima recordação pessoal: sobretudo nos primeiros
tempos do Pontificado, toda vez que havia uma audiência e eu passava para
saudar o Papa, como de costume, me dava um Terço, porque habitualmente se dá
uma imagem, um Terço, uma medalha... e toda vez que o Papa me dava um Terço,
dizia: "Também os padres devem se lembrar de rezar". Eis que jamais
me esqueci disso, porque manifestava assim, de modo muito simples, a sua
convicção e a sua atenção para o lugar da oração em nossa vida, inclusive e em
particular na vida de quem tem tarefas de responsabilidade no serviço do
Senhor. Bento XVI certamente sempre foi um homem de oração, em toda sua vida, e
– provavelmente – desejava ter um tempo para viver essa dimensão da oração com
mais espaço, totalidade e profundidade. E este agora é o seu tempo."
RV: Por outro lado, a vida de oração de
Bento XVI não deixa de ter momentos de encontro, inclusive com o Papa
Francisco, como sabemos. O que o senhor pode nos dizer sobre essa dimensão da
vida distante dos olhos do mundo, mas não isolada de Joseph Ratzinger?
Pe. Federico Lombardi:- "Creio que
é justo dar-se conta de que ele vive num modo discreto, sem uma dimensão
pública; mas isso não significa que vive isolado, fechado como numa pequena
clausura. Desempenha uma atividade normal para uma pessoa anciã – uma pessoa
anciã religiosa: uma vida de oração, de reflexão, de leitura, de escritura no
sentido que responde à correspondência que recebe; de colóquios, de encontros
com pessoas que lhe estão próximas, que com satisfação encontra, com as quais
considera útil manter um diálogo, que lhe pedem conselho ou proximidade
espiritual. De fato, trata-se da vida de uma pessoa rica espiritualmente, de
grande experiência, numa relação discreta com os outros...
O que não existe é a dimensão pública com a
qual estávamos acostumados, sendo o Papa, e, portanto, estava sempre nas telas,
diante da atenção do mundo inteiro. Isto não há; mas fora isso é uma vida
normal de relações. E entre essas relações encontra-se a relação com o seu
sucessor, a relação com o Papa Francisco que, como sabemos, tem momentos
inclusive de encontros pessoais, de diálogo... Um já esteve na casa dou outro.
Ademais, existem outras formas de contato que podem ser o telefone ou mensagens
que são enviadas: uma situação de relação totalmente normal, diria, e de
solidariedade. Parece-me ser muito bonito para nós, quando temos aquelas raras
imagens dos dois Papa juntos e que rezam juntos – o Papa atual e o Papa
emérito: é um sinal muito bonito e encorajador, da continuidade do ministério
petrino no serviço da Igreja."
RV: Uma última questão: Pe. Lombardi, o
senhor acompanhou Bento XVI durante os seus quase oito anos de Pontificado. O
que o Papa emérito está lhe dando agora, pessoalmente, espiritualmente, desde
11 de fevereiro do ano passado?
Pe. Federico Lombardi:- "Sinto
muito a presença do Papa Bento XVI, como uma presença espiritual forte que
acompanha, que serena... Penso nas grandes figuras de anciãos da História da
Igreja e da História sagrada; em particular, todos pensamos – por exemplo – em
Simeão, que acolhe Jesus no Templo e que olha com alegria também para seu
destino eterno e inclusive para o futuro da comunidade que continua caminhando
nesta terra. Todos sabemos o grandíssimo valor de termos conosco anciãos,
anciãos ricos de sabedoria, ricos de fé, serenos: são verdadeiramente uma
grandíssima ajuda para quem é mais jovem, para seguir adiante olham para o
futuro com confiança e com esperança. É o que Bento XVI é para mim – e creio
para a Igreja: o Grande Ancião, sábio, digamos – inclusive – santo. É sereno,
porque é bonito, quando o vemos, dá verdadeiramente uma impressão de grande
serenidade espiritual. Conservou o seu sorriso com o qual nos acostumamos, nos
momentos bonitos em que o encontrávamos – e que, portanto, nos convidam a
seguir adiante no caminho, confiantes e com esperança."
Fonte:
Portal NewsVa
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