Um
ano depois da sua resignação, Bento XVI participou, pela primeira vez em
público, numa celebração presidida pelo Papa Francisco. A sua presença humilde
e silenciosa, na primeira fila da basílica de São Pedro, junto cardeais, é um
gesto carregado de eloquência. A data e a circunstância falam por si: é que 22
de Fevereiro é o dia da Cadeira de São Pedro – festa diretamente relacionada
com o magistério do Papa, desde o tempo dos primeiros cristãos - em que se
celebra a unidade da Igreja, fundada sobre o Príncipe dos Apóstolos.
Neste dia de festa, Francisco criou 19 novos
cardeais provenientes de vários continentes e pediu-lhes que vivessem a
comunhão com o Papa e entre si, porque “se prevalece a mentalidade deste mundo,
sobrevêm as rivalidades, as invejas, as facções...”. Com efeito, nos últimos
meses, a opinião pública tem-se enchido de análises e interpretações que
contrapõem Francisco a Bento XVI, como se fossem rivais ideológicos. Um desses
arautos da divisão – o teólogo dissidente Hans Küng – já obteve resposta de
Ratzinger que, em recente carta, lhe contrapôs estar grato “por poder ligar-se
ao Papa Francisco, por uma grande identidade de pontos de vista e por uma
amizade de coração”.
Mas, para desfazer quaisquer dúvidas, Bento
XVI resolveu aceitar o convite de Francisco e participar, fisicamente, numa das
mais solenes celebrações do calendário pontifício. A sua presença vestida de
branco, junto à enorme mancha vermelho-sangue da púrpura cardinalícia, bem como
o caloroso abraço que Francisco lhe deu no início e no fim da celebração,
revelaram ao mundo um poderoso sinal de unidade - reflexo, aliás, daquela
certeza com que o Papa emérito se despediu há um ano, na sua última audiência
geral: “a barca da Igreja não é minha, não é nossa, mas é do Senhor que não a
deixa afundar; é Ele quem a conduz”; por isso, a Igreja “não é uma organização,
nem uma associação de fins religiosos ou humanitários, mas é um corpo vivo, uma
comunhão de irmãos e irmãs, no corpo de Jesus Cristo, que nos une a todos”.
Aura Miguel
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