Fulgurante
de luz, Bento de Núrcia, glória da Itália e de toda a Igreja, resplandece como
astro na escuridão da noite. Quem pacientemente estudar a sua gloriosa vida e
entrar, à luz da história, no tempestuoso tempo em que viveu, há-de sentir,
indubitavelmente, a realidade da promessa que o Senhor deixou aos Apóstolos e a
sociedade que fundara: "Estarei convosco, todos os dias, até a consumação
dos tempos" (Mt 27,20). Sentença e promessa que jamais perderá, por
certo, a sua atualidade, porque se envolve no curso dos séculos, que a divina
Providência governa e encaminha.
Com efeito, quando são mais audazes e
agressivos os inimigos da religião e mais temerosos os baixios em que se agita
a nau Vaticana de Pedro, quando tudo, finalmente, se vai, a desmoronar, e já
pereceu de todo a esperança humana, então, precisamente, o amigo que não falta,
o divino consolador, dispensador dos tesouros celestiais, Jesus Cristo, aparece
para reconstituir as fileiras abaladas, com novos contingentes de atletas, que
saiam a defender em campo a república cristã, que a reintegrem como antigamente
e que, se puder ser, com o auxílio da graça, a enriqueçam de novas conquistas.
Entre esses atletas, refulge com luz
particular "Bento, que duplamente o foi: por graça e de nome". Por especialíssimo
desígnio da Providência, salientava-se nas trevas do século o santo patriarca,
à hora precisa em que a situação da Igreja e dos povos atravessava uma crise
profunda. O império romano, que atingira o apogeu da glória, estendendo-se, por
efeito duma política justa e moderada, aos povos mais diversos, a ponto de
afirmar um dos seus escritores "que melhor que império chamar-se-lhe-ia
padroado da terra", como tudo que é humano, tinha declinado para o ocaso.
Debilitado e corrompido por dentro, esfacelado,
por fora, pelas repetidas incursões dos bárbaros que desciam do setentrião, o
Ocidente afundava-se na mais completa ruína. Nesta horrível procela, cheia de
perigos e destroços, donde surgiria à humanidade a esperança de auxílio, a
garantia de salvar da voragem, intactas ao menos, as relíquias do seu patrimônio?
Da Igreja católica. Com efeito, todos os empreendimentos e instituições,
baseados unicamente no arbítrio dos homens, que reciprocamente se sucedem e
engrandecem, no rodar do tempo, vêem, em virtude da própria fragilidade
essencial, decair e arruinar-se.
A Igreja, porém, possui, derivante do próprio
fundador, a propriedade de fruir da vida divina, dum vigor incessante que lhe
permite sair da luta com os homens e as coisas sempre vencedora, apta para
arrancar, ainda do entulho, uma idade nova e mais feliz e reagregar os povos,
com o influxo dos princípios cristãos, numa sociedade rejuvenescida. Por isso,
na provável ocorrência do XIV centenário da morte do santo patriarca, em que
coroado de méritos e esgotado de trabalhos despendidos em prol de Deus e dos
homens, venturosamente passou deste exílio da terra à pátria celeste, houvemos
por bem, veneráveis irmãos, salientar, ainda que resumidamente, nesta nossa
carta encíclica o momentoso papel que desempenhou na reintegração e reforma das
coisas do seu tempo.
Pio
XII – excerto Carta Encíclica “Fulgens Radiatur” – 21 de Março de 1947
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