“Estando fechadas as portas...”
O primeiro encontro com o Senhor ressuscitado
se faz em meio a uma atmosfera de medo, tristeza e desilusão. Não somente as
portas do lugar onde os Apóstolos se encontravam estavam fechadas, mas
sobretudo seus corações e suas mentes não se tinham abertos para a esperança.
Sabendo desta necessidade dos Discípulos e da amargura de suas almas, o
Ressuscitado lhes dá aquilo que mais precisavam: o dom da paz! O Senhor sonda o
coração do homem e só Ele pode reconhecer as reais necessidades do ser humano.
“A paz esteja convosco!” diz o Senhor a eles,
mas também a nós: diante das crises internas do nosso ser, diante do abatimento
da alma, ante as lutas diárias que cada um de nós trava no campo do mundo, como
não ver aí a necessidade da paz de Deus? O Senhor nos chama à paz, nos dá a paz
e nos capacita para a paz. Mas como será isso? Como posso ter a paz e dar a
paz? A resposta está na boca da Comunidade dos Apóstolos reunida: “Vimos o
Senhor!” Só na presença de Deus, só quando Ele estiver em nosso meio, é que a
paz pode, de fato, encontrar morada em nós, apesar das barreiras humanas,
apesar de algumas portas continuarem fechadas.
São João nos recorda que esta visita do
Cristo se dá no “oitavo dia”. Este dia é o Domingo, o Dia do Senhor! O Domingo
é o primeiro e o oitavo dia: “primeiro” como referência à nova criação do mundo
instaurada pelo Cristo; Ele é o Novo Adão, Obediente que foi até à Cruz, Homem
Novo – não ferido pelo pecado, que renova todas as coisas e o Domingo também é o
“oitavo dia”, lembrando-nos a “parusia”, dia glorioso em que o Senhor virá para
coroar a obra de Redenção com seu juízo, justo e santo. Os cristãos, ao se
reunirem no Domingo, lembram sua origem e seu fim; nascem do lado aberto de
Jesus e devem sempre voltar a esta fonte que jorra para a vida eterna! Celebrar
o Domingo numa igreja, é correr livremente e exultante para o encontro com o
Ressuscitado.
O Senhor não deseja que os seus se
petrifiquem no medo, nem que Tomé continue retido em suas dúvidas. Então o
Senhor volta. A Tomé, passado na História como o “Discípulo incrédulo” (mas na
verdade ele levava consigo a inquietação de todos nós), Jesus apresenta suas
chagas. As marcas de seu amor continuam lá; “O amor é mais forte que a morte”,
já disse o Cântico dos Cânticos. Nem a morte, nem o tempo, nem a dúvida, nem o
medo, nem a traição, nada pôde apagar as marcas de sua paixão pelo homem! O
verdadeiro amor é assim, deixa marcas indeléveis, nada o dissipa, nada o
perturba; quem diz que deixou de amar, é porque nunca amou.
O texto de São João faz questão de acentuar
por duas vezes, que o lugar em que os Apóstolos se encontravam estava fechado.
No entanto, para o Cristo não há portas fechadas; Ele pode entrar em qualquer
lugar, em qualquer realidade. Como não ver aqui o que o Senhor faz também
conosco? Não há um lugar sequer em nossa vida que o Cristo não possa entrar e
deixar aí um bocado de sua paz... Em sua presença não subsistem dúvidas: Ele se
apresenta como a Verdade que dá sentido, como o caminho seguro a seguir e,
finalmente, como a vida que é nova e feliz.
A profissão de Tomé rompeu os tempos. A
expressão “meu Senhor e meu Deus”, que tantas vezes dizemos diante do
Santíssimo Sacramento, é uma das formas mais belas de louvar o nosso Deus;
reconhecê-Lo como “Senhor”; é dizer-se “servo” e adorá-Lo como “Deus”, é dizer
“não” à idolatria e amar Àquele que primeiro nos amou... “Meu Senhor e meu
Deus” - devemos dizer sempre! Ao contemplar o amor sem medidas de Deus,
digamos: “Meu Senhor e meu Deus!” Ao sentir sua misericórdia sem limites,
digamos: “Meu Senhor e meu Deus!”
O Papa João Paulo II, agora Beato, nos deixou
este Segundo Domingo de Páscoa como o Domingo
da Misericórdia. O que é misericórdia? É inclinar-se para o outro com amor
de benevolência, aproximar-se do pecador, sem se deter em sua miséria. Deus, só
Ele é assim por excelência! Mas devemos imitá-Lo! Tantas vezes ouvimos mais
palavras de revolta, de violência e de julgamento e menos, palavras de bondade,
de perdão e de acolhimento... Infelizmente, ainda estamos muito longe de
exercer a misericórdia como Deus quer...
O convite do Beato João Paulo II foi sempre
“abrir as portas para Cristo”. Hoje, mesmo tentados a permanecer de portas
cerradas para Deus, como ouvimos no Evangelho, ouçamos o apelo do Beato: “Não
tenhais medo! Abri as portas, melhor, escancarai as portas a Cristo!”
Neste Domingo da Misericórdia, abramos nosso
coração de par em par! Deixemos que Ele se aproxime de nós, aprendamos do seu
amor e nos enchamos de sua paz. Amém!
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