Há de se dar plena razão aos
que consideram a participação dos candidatos nos debates veiculados pelos meios
de comunicação inócua e pouco relevante para o processo de discernimento dos
eleitores. Também são coerentes os argumentos dos que apontam a propaganda
eleitoral como verdadeira enganação. Pode não chegar a tanto, mas essas
produções chamam a atenção pela exposição pouco nobre de pessoas que, no afã de
ganhar voto, por meio de seus discursos, se desenham como “salvadoras da
pátria”. Em suas falas, buscam aproximar-se dos heróis da ficção. Talvez, possa
até constituir objeto de estudo a semelhança entre os personagens folclóricos
da literatura e a imagem que a propaganda eleitoral produz sobre candidatos.
Eles aparecem como cidadãos e cidadãs com identidade, trajetória e história não
condizentes com o que, de fato, são; e sempre longe do que podem vir a ser.
Viver de miragens do próprio ego, incontestavelmente, é uma das mais trágicas
situações existenciais, com a produção de prejuízos para a cidadania e
comprometimentos sérios na vida política.
Neste sentido, o desempenho dos candidatos
nos debates eleitorais não consegue corresponder às demandas do processo
eleitoral. Na busca pelo voto a todo custo, sob a pressão das pesquisas,
os candidatos à presidência da República portam-se como se estivessem em um
ringue de boxeadores, com uma platéia de torcedores. O eleitor-torcedor, perdão
se for exagero, não simplesmente movido pelo grande desejo de que sejam
encontradas saídas para os graves problemas sociais, se deixa afetar por
descompassos afetivos. Alegra-se ao ver seu candidato desferir “um golpe
certeiro” no adversário. Os comentários pós-debate sublinham, sobretudo, como
um “esfregar de mãos”, o discurso ferino, as evasivas de uns, as conivências e
posturas comprometedoras de outros. O saldo é pouco educativo.
De fato, lamentavelmente, as perguntas e as
respostas formam uma dinâmica que se resume aos “golpes” e autoelogios. O
processo tem muito da perversão humana, predatória, de ganhar e convencer por nocautear
o outro. Os ataques perpassam a análise de incompetências. Também se
fundamentam nas falhas morais que levam à corrupção e à incapacidade de se
compreender que a cidadania, a presidência de uma república, o governo de um
Estado, da própria casa ou da empresa, alcança nobreza e incontestada
importância quando a meta prioritária é o bem comum. Lamentável, pois, é a
classificação medíocre da participação política. As escolhas vão sendo
definidas por temas que não deveriam ser tão recorrentes na vida do povo.
O atual processo de discussão sobre o perfil
mais adequado para a presidência da República, em vez de contribuir para a
decisão do eleitor, deixa mais dúvidas, por se reduzir à lógica do ringue. Não
se consegue revelar o perfil estadista dos candidatos. Além disso, é muito
humilhante prestar-se à desmoralização mútua, lógica do discurso para
simplesmente conseguir voto. Isto não é próprio de quem reúne condições para
ser representante do povo no cargo mais importante do país. Não se está
conseguindo construir um caminho em que os candidatos possam debater seus
entendimentos, propostas e compromissos. Um percurso necessário para o
amadurecimento dos projetos e, também, para o discernimento dos eleitores.
Uma via possível é investir nas sabatinas, em
diferentes ambientes, enriquecidas pela presença de especialistas de diversos
campos, representantes da sociedade - especialmente daqueles comprometidos com
os interesses dos mais pobres - para ajudar na avaliação da estatura do
candidato. Não é fácil dar este passo novo, por muitas razões. Alguns vão dizer
que a política é assim no mundo inteiro e, por isso, a sociedade brasileira não
teria condições de fazer diferente, tornando-se exemplo. Infelizmente, a
mediocridade na política brasileira é um veneno. Segue perpetuada pelos
interesses partidários e desejo de galgar o poder; nele permanecer para fazer
da máquina administrativa o lugar do serviço aos pares, e não aos pobres.
Incluindo a competência de gerentes, o
carisma de líderes, o Brasil precisa de homens e mulheres com componentes
morais para a saudável e relevante representação política. Essa tarefa consiste
em compartilhar o sentimento do povo e em buscar, com políticas emancipatórias
- não apenas compensatórias - a solução de problemas sociais. Tem este perfil
quem exerce o poder com espírito de serviço. Isto significa ter paciência,
moderação, modéstia, caridade e esforço de partilha - remédios para a ganância
pelo poder. A corrupção política do sistema democrático não permitirá o
surgimento de gente com o perfil esperado, perpetuando a triste conclusão de
que os debates, com suas réplicas e tréplicas, mostram uma realidade pouco
interessante. Revelam candidatos que buscam convencer o eleitor indicando que
os outros são ainda piores.
Que venham as reformas necessárias para mudar
esse cenário e que chegue logo o momento em que nossos dirigentes exerçam o
poder não como se fosse sua propriedade ou de partidos, mas como uma delegação,
a vivência de uma representatividade. O façam ancorados sempre nas quatro
exigências fundamentais: verdade, justiça, amor e liberdade, que podem dar
envergadura e perfil a quem se aventura em propor seu nome a cargos eletivos e
representativos.
Dom Walmor Oliveira de
Azevedo, Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
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